19 maio Comissão de Educação publica nota contra atuais datas do Enem
A Comissão de Educação do Conselho Regional de Psicologia do Rio Grande do Norte (CRP-17/RN) preocupada com o cenário da pandemia e sua repercussão na Educação, vem chamar a atenção da sociedade e da categoria quanto os rumos tomados na execução do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
Os atuais prazos adotados pelo Ministério da Educação geraram a insatisfação de várias instituições de ensino e entidades estudantis. O cronograma com datas para realização do Enem em 2020 está com o seguinte calendário: provas impressas em 01/11 e 08/11, e, provas digitais em 22/11 e 29/11. A partir disso, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES), via mandado de segurança, solicitaram ao Superior Tribunal de Justiça o seu adiamento. Ao mesmo tempo, o Conselho Nacional das Instituições da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica (CONIF), nos termos do Ofício nº 100/2020, solicitou ao Ministério da Educação (MEC) o adiamento da realização das inscrições e das datas das provas.
Nesse mesmo passo, os projetos legislativos nº 137 e 167, de autoria do senador Izalci Lucas e do deputado federal professor Israel Batista e outros, pretendem suspender os efeitos dos editais nº 25 e 27 do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), dos quais mantêm a realização do exame e seu respectivo calendário. Nos projetos, os parlamentares consideram a necessidade da reorganização do exame tendo em vista a pandemia da COVID-19 e a suspensão das atividades de ensino nas instituições escolares no país. Dessa forma, entendemos que realização do ENEM requer maiores reflexões, com ampla participação da sociedade e dos interessados.
Consideramos que a avaliação diagnóstica das escolas de ensino médio e universidades do país é uma ação urgente para que o MEC reconheça a realidade das instituições e conheça o trabalho de reorganização dos calendários escolares de 2020 feito por elas. Isso permite planejar um ENEM atípico para um ano letivo igualmente atípico. Sobre isso, o Conselho Nacional de Educação (CNE) em 28 de abril, expediu parecer orientativo, em que considera possível o comprometimento do calendário escolar de 2021 e eventualmente de 2022.
O CNE chama atenção também para as fragilidades e as desigualdades históricas da nossa sociedade, especialmente agravadas pela pandemia da COVID-19, em particular os fatores socieconômicos e étnico-raciais. Num país com alto índice de pessoas em situação de vulnerabilidade e exclusão, a educação ainda é o principal fator de mobilidade e transformação social. E o ENEM, por conseguinte, é a principal porta de acesso ao Ensino Superior para estudantes oriundos das populações mais empobrecidas.
Segundo o Censo Escolar de 2018, realizado pelo INEP, 81,44% ou 39,5 milhões dos alunos do Ensino Médio no Brasil são de escolas públicas, as quais concentram as faixas mais pobres da população. Logo, para que este grande contingente de estudantes possa ter condições dignas de concorrer a uma vaga no Ensino Superior, é preciso considerar a possibilidade do acesso aos recursos tecnológicos, em razão da adoção da modalidade de ensino a distância (EAD) por parte das instituições de ensino públicas e privadas durante a crise de saúde pública.
A esse respeito, em 2019, foi publicado um estudo pela TIC Domicílios, coordenado pelo Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br), mostrando que 96,5% das classes A e B (classes mais ricas) tem sinal de internet, enquanto que 59% das classes D e E (classes mais pobres) não conseguem acessá-la. Ainda segundo esta pesquisa, 78% da população, cuja renda familiar é inferior a um salário mínimo, tem acesso apenas ao celular. Como se vê, além da desigualdade estrutural do acesso ao Ensino Superior, o acesso desproporcional às tecnologias de informação indica não só que as condições de competição do ENEM são injustas, mas que estão, nesse momento, ainda mais evidenciadas.
Um outro ponto que também merece destaque diz respeito aos impactos da pandemia na saúde mental dos estudantes, assim como na população em geral. Segundo um estudo realizado em abril deste ano na Etiópia e citado pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS/OMS), houve um aumento de três vezes nos sintomas de depressão se comparado com estimativas anteriores à pandemia. Ainda segundo a OPAS, as condições de saúde mental são responsáveis por 16% da carga global de doenças e lesões em pessoas com idade entre 10 e 19.
Desta maneira, não há como pensar em uma aprendizagem significativa em um momento em que o número de queixas relacionadas ao adoecimento psíquico e a busca por suporte psicológico profissional aumentam a cada dia em razão dos fatores associados ao contexto atual, como a incerteza sobre o futuro, o medo do contágio, o luto pela perda de parentes ou pessoas próximas, os conflitos interpessoais relacionados à convivência constante, mudanças bruscas de rotina, dentre outros aspectos.
Neste sentido, a Psicologia Escolar e Educacional, entende que os processos em educação se dão pela prática democrática e na garantia dos direitos fundamentais dos estudantes e profissionais da educação. Reconhece também que a manutenção das datas previstas para o ENEM 2020, sem que todos estudantes tenham reais condições de se preparar para a prova, é um ato de injustiça social. Esta posição do MEC e do INEP aprofunda os mecanismos de desigualdade desde o acesso, passando pela permanência no Ensino Superior, até a empregabilidade e qualidade de vida de grande parte do povo brasileiro.
Inteiramos o compromisso com um projeto educacional que vise a coletividade e que venha responder as questões que afetam diariamente a vida das pessoas, como a desigualdade e a exclusão social, na tentativa da superação e não da segregação. Reforçamos que processo de bem-estar social se integra com saúde e educação como bases promotoras no processo de vida de adolescentes, jovens e familiares que apostam na transformação da sociedade e da cidadania.
Comissão de Educação – CRP-17
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